sábado, 29 de junho de 2013

Uns óculos no Santo António.


Quando lá chegaram, o meu tio Carlos desapareceu por breves instantes. Voltou orgulhoso, ostentando uns óculos de sol. Onde é que encontraste isso, pá? perguntou-lhe o tio. Comprei-os! respondeu com os olhos a rir por detrás das lentes escuras. Foste rápido! concluiu o seu tio, divertido com o desembaraço já habitual do sobrinho.

Naquele ano, o meu avô António estava de visita e, ao que parece, fazia questão de marcar presença nas festas e romarias quando visitava a família. Por isso, naquele ano, a minha mãe foi ao Santo António. Com a mãe, irmãs e cunhado, com as Gémeas do Valdamego e ainda com a Gina do Balsalgueiro. E, claro, com o primo Carlos. Dos brasileiros, da Relva-da-Mó, para que não fiquem dúvidas.

Não importava que tivessem de começar a caminhada às 8h00 da manhã. Chegariam a tempo para a missa.  E o arraial era só depois do almoço: um galo morto na véspera e um tacho de arroz para acompanhar. Broa, claro, que se poupava o pão que se vendia por lá. E o garrafão, presença obrigatória em todas as fotografias da época, qualquer que fosse a família a recordar.

No grande pic-nic, não importava se o almoço era rico ou pobre: chegava um pedaço de carne cozida, um chouriço, um pouco de queijo ou  presunto e broa. O que realmente alimentava era o som da concertina e da flauta, do riso, o namorico entabulado entre duas modas, a amizade que se respirava no Santo António das Neves. Talvez nem se soubesse que os seus poços gelaram Lisboa durante séculos... gelada, agora, só a água da nascente que a todos servia nestas breves visitas.

... e o Tio Armando e a Tia Teresa... e esta faz-me lembrar alguém que eu conheço... quem é mãe? Quando penso no Santo António, lembro-me imediatamente da foto pequena, quadrada, de margem recortada, preto e branco, que é a minha ligação a este dia. É a Gina. E este, conheces? Semicerrei os olhos para ver melhor. É Ti Carlos. Mas porque é que ele tem óculos? A gargalhada franca da minha mãe fez-me antever a história que lá vinha. Com ele, só podia ser das boas...

Já lá fui, claro. Mas sem arraial. Até já vi o Santo António das Neves, aquele imenso campo verde, coberto de neve. Mas, para mim, aquela romaria terá sempre um sorriso de surpresa do meu avô, uma resposta pronta do meu tio Carlos e um par de óculos escuros.


Queria deixar qualquer coisa especial para a despedida do São Pedro e foi disto que me lembrei.
Um abraço 
(PS- Prometo juntar a dita foto)

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