E assim que punha os pés na estrada de terra, depois de bem sacudida pelos imensos buracos, sentia o perfume inconfundível do fumo da chaminé dos meus avós...acho que era mesmo a única altura em que gostava daquele cheiro - à chegada. No dia seguinte, já estaria desgostosa por ele não se soltar da roupa e dos cabelos, mesmo que resolvesse evitar chegar-me à lareira e enfrentar o frio gélido da minha sala...
Mas o fumo lá continuaria, uma constante nas minhas férias de Natal, também pelo facto de o meu avô todos os anos querer fazer o sobreiro de Natal. Não o bolo - lá guloso era ele, verdade seja dita - mas sim o madeiro que acendia todos os anos na véspera de Natal e que deveria arder até ao Dia de Reis... explicava-me o meu avô, pacientemente, todos os anos, que era o costume "para as almas se irem aquecer". E eu lembro-me de ficar a olhar para o madeiro e pensar como poderiam as almas vir aquecer-se naquele tronco que ficava apenas incadescente durante a noite... e o calor e as cores do lume embalavam-me enquanto aquecia os pés numa tentativa frustrada de me deitar com eles quentes... frustrada, claro está, porque a casa era pequena mas o frio suficiente para gelar em 30 segundos.
De uns anos para os outros, sempre fez parte da nossa tradição de Natal o sobreiro que o meu avô zelava com tanto carinho. E as almas puderam parar lá por casa, nas suas deambulações nocturnas, e ficar mais consoladas com o calor não da lareira, mas da lembrança dos vivos e do amor que se lhes guarda mesmo sem pensar particularmente em alguém.
Lembro-me de, no ano em que fiquei sem os meus avós, me lembrar do sobreiro de Natal e de como seria bom se as suas almas também encontrassem lareiras como a nossa para se aquecerem. E lembro-me de adormecer a sorrir pensando que o amor da nossa saudade seria suficiente...
Que a beleza das tradições e conhecimentos dos antigos seja preservada, e nos sirva para crescermos e nos tornarmos melhores pessoas.
Um abraço!
Sem comentários:
Enviar um comentário