segunda-feira, 15 de abril de 2013

Cascar batatas

A minha avó Emília cascava as batatas. Geralmente sentada num banco, ao lado esquerdo da porta da entrada da casa. Se fechar os olhos ainda agora a lá vejo, muito pacientemente, a retirar com a maior facilidade uma pele quase translúcida. Só quando comecei a ajudar nas culinárias lá de casa é que abarquei a arte envolvida neste aproveitamento da batata, com desperdício (quase, quase) zero. Não raro, na preparação do almoço com a ajuda das filhas, ouvia-a dizer "mas vocês cascam-nas tã rápido!" sobre a diferença entre as pilhas resultantes do trabalho respectivo. Parando o seu gesto preciso de poupança vivida, ficava num orgulho das suas meninas de quem frequentemente gabava os cozinhados, sem valorizar as gramas perdidas pela velocidade destas.
 
Eu fui aos treinos com ela. Do outro lado do balde das batatas já lavadas da terra branca ou negra, sentada num naqueles bancos de madeira de 20cm, óptimos para a lareira, tentei aprender a cascar batatas. Ofereci-lhes gargalhadas pela minha falta de jeito inicial, e percebi finalmente a lâmina arredondada pelos anos das facas da aldeia. Aprendi a arte de cascar batatas e foi com orgulho que exibi a primeira pele sem grama de batata aos olhos incrédulos da minha mãe, a quem o tempo exigia antes o desembaraço. Foi divertido, como em tudo nas crianças, até ao dia em que percebi que tinha passado a ser assumida como garantida a minha ajuda. Consegui, também com a arte das crianças, remeter a minha preciosa prestação apenas para a azáfama dos dias de festa. Nesses, também gostava de ajudar a espetar as cebolas e batatas pequenas nos arames em que assavam no forno, entre tabuleiros de lombo e a broa, os bolos de carne e cebola. E depois punha a mesa e desencantava bancos e cadeiras para receber a família que víamos duas vezes por ano, mas de que sentíamos verdadeira falta caso não estivesse. Foi raro.

A minha avó também passajava as calças do meu avô António. Com uma paciência infinda e pontos curtos e invisíveis aos olhos mais atentos, a minha avó fazia renascer as calças com que ele guardava o gado. Sem remendos, sem costuras, sem ar andrajoso. Ensinou-me que a má figura do marido também é vergonha da mulher, que não sabe cuidar dele. O "também", para mim, fazia toda a diferença. A minha avó orgulhava-se do seu homem, que a tratou por cachopa até ao dia em que deixou de a poder chamar para sempre, 57 anos depois da primeira vez.
 
Esta arte não aprendi. Requeria demasiada destreza no manuseio dos instrumentos cirúrgicos necessários a operação tão delicada e, honestamente, nunca me achei capaz. Mas aprendi que o hábito e a vontade fazem com que se volte a ver aos 80 anos como não se via aos 60, que os dedos retorcidos pelas artroses podem continuar ágeis se souberem que só eles farão o trabalho, que as costas arqueadas doem menos se se trabalhar por amor.

A minha avó nunca perdeu grande tempo com lições de economia e finanças, de bons modos ou educação comigo. Ainda hoje consigo ouvi-la contar algumas histórias que repetiu vezes sem conta à lareira e de que eu já conhecia pormenores que hoje seriam novos outra vez. E essas, porque estavam nos seus gestos diários, essas sim me mostraram como ela, sem saber ler ou escrever, era uma grande mulher. E hoje, de cada vez que descasco uma batata, lembro-me que faria melhor se a cascasse. E quando descubro que o consegui sem uma dedicação consciente a tal, sinto-me contente. Qualquer que seja... a batata!

Um abraço. 

terça-feira, 2 de abril de 2013

A aldeia vem à cidade!!!

Que é como quem diz: "vamos lá a juntar-nos que já faz falta uma festa!"...
 
Será em Maio (dia 25), quando as nuvens que pairam sobre Portugal e arredores já tiverem chovido tudo o que tinham para chover e as flores decorarem novamente os nossos caminhos - tudo favorece um grande dia de convívio e animação...
 
A aldeia vem à cidade!!!! ou melhor, à Terrugem, pois é lá o restaurante que escolhemos para um dia à moda da nossa terra - grande almoço, com os nossos sabores, a nossa alegria e o convívio de que todos gostamos e que de que vamos sentindo falta ao longo do ano. Começando às 13h00, a tarde será animada com música ao vivo, bailarico e brincadeira, cantorias e bons petiscos, sempre bem regados com serviço de bar - trazemos a Eira Nova até à capital... e sem hora de fecho, claro!
 

 
Contamos com todos!!!! Inscreva-se junto do seu agente do costume...
 
E até lá, vá ensaiando: o pezinho para a dança, a barriguinha para as comidinhas boas dos nossos convívios e a gargalhada... porque vai dar-lhe muito uso!
 
Até lá!